Era mais do que apenas uma chuva fina. Era, de certa forma, um desmanchar lento e triste do céu, como se a força que antes o mantesse suspenso aos poucos fosse abrindo os dedos em desistencia.
As ruas tornam-se vazias, os homens se escondem em casa. Se escondem no trabalho. Apenas mantém os olhos, furtivos, por detrás das janelas. Evitam vislumbrar a queda como se evita assistir a morte de um animal.
E no canto mais baixo da rua, onde não há para onde fugir, a existencia se empoça.
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
Esboço de sombras
Há tempos que os sonhos cessaram e esfriaram os leitos.
Tudo que era azul e tudo que era negro se iluminou, e com eles o que lhes habitava.
O sol, que outrora inflava velas e páginas, hoje queima as folhas das plantas mais frágeis.
Me sento e observo o fim da migração. Pois, apesar dos alongados prédios, do asfalto baforento. Dos canos, dos fios, dos motores. Apesar das idéias, da pressa e das barreiras, permaneço sentado debaixo da velha ponte abandonada. Na velha estrada de terra. Castigado pelo mesmo sol e pelo antigo Pai Tempo.
Somos o coágulo do Tempo.
Tudo que era azul e tudo que era negro se iluminou, e com eles o que lhes habitava.
O sol, que outrora inflava velas e páginas, hoje queima as folhas das plantas mais frágeis.
Me sento e observo o fim da migração. Pois, apesar dos alongados prédios, do asfalto baforento. Dos canos, dos fios, dos motores. Apesar das idéias, da pressa e das barreiras, permaneço sentado debaixo da velha ponte abandonada. Na velha estrada de terra. Castigado pelo mesmo sol e pelo antigo Pai Tempo.
Somos o coágulo do Tempo.
terça-feira, 26 de outubro de 2010
Trecho
" Minhas mãos parecem dois blocos de gelo e posso ouvir meu coração batendo alto dentro dos meus ouvidos. Ligo a torneira do banheiro e a água jorra pela penumbra. Ainda são 5 horas da manhã.
Sinto um cheiro insuportável de ferro exalar de mim. Foi esse maldito cheiro que me acordou, rompeu a horrenda sucessão de pesadelos que violentavam meu sono. Acordei num pulo, segundos antes de, talvez, morrer afogado no meu próprio suor.
Vejo o sangue em minhas mãos, sangue e sombras. Talvez só sombras mas não posso acender as luzes e me certificar. Não posso olhar no espelho e enxergar meus olhos. Agora, tenho olhos de animal. Tenho grandes olhos de hiena. Tenho o bafo quente e faminto da hiena. E sangue nas mãos. As lavo, desesperadamente. Ontem rompi o fio que me separava das feras. Me tornei uma fera, um pedrador. Não posso mais voltar para a cama, devo dormir sozinho em meio a folhas secas e gravetos velhos de um canto isolado. Devo deixar que a brisa fria da noite me livre desse odor. Matarei minha fome comendo insetos e pequenos mamíferos. Saciarei minha sede com sangue e água barrenta. Calarei a razão e o sentimento.
Esfrego minhas mãos mas as manchas permanecem. Elas não podem ser lavadas, não estão na pele.
Sinto minhas pernas fraquejarem e me seguro nas beiradas da pia. Meus olhos, refletidos no espelho, são duas manchas negras. Não sou mais um homem."
Sinto um cheiro insuportável de ferro exalar de mim. Foi esse maldito cheiro que me acordou, rompeu a horrenda sucessão de pesadelos que violentavam meu sono. Acordei num pulo, segundos antes de, talvez, morrer afogado no meu próprio suor.
Vejo o sangue em minhas mãos, sangue e sombras. Talvez só sombras mas não posso acender as luzes e me certificar. Não posso olhar no espelho e enxergar meus olhos. Agora, tenho olhos de animal. Tenho grandes olhos de hiena. Tenho o bafo quente e faminto da hiena. E sangue nas mãos. As lavo, desesperadamente. Ontem rompi o fio que me separava das feras. Me tornei uma fera, um pedrador. Não posso mais voltar para a cama, devo dormir sozinho em meio a folhas secas e gravetos velhos de um canto isolado. Devo deixar que a brisa fria da noite me livre desse odor. Matarei minha fome comendo insetos e pequenos mamíferos. Saciarei minha sede com sangue e água barrenta. Calarei a razão e o sentimento.
Esfrego minhas mãos mas as manchas permanecem. Elas não podem ser lavadas, não estão na pele.
Sinto minhas pernas fraquejarem e me seguro nas beiradas da pia. Meus olhos, refletidos no espelho, são duas manchas negras. Não sou mais um homem."
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Ócio
As vezes, quando caminho,
me basta apenas a lama nas botas.
Não sinto o pó das pequenas alturas
não sinto a faca do tempo
que insiste em podar as extremidades secas da vida.
Quando caminho, abaixo os olhos
para evitar os rostos
para evitar a fala.
E quando o céu abre e o sol faz cantar árvores
deixo que queime apenas minha nuca
pois me basta a lama nas botas.
"O ócio, Luiz, te é molesto; pelo ócio
exultas e demasiadamente gesticulas,
o ócio arruinou, antes, tantos reis como
cidades opulentas."
me basta apenas a lama nas botas.
Não sinto o pó das pequenas alturas
não sinto a faca do tempo
que insiste em podar as extremidades secas da vida.
Quando caminho, abaixo os olhos
para evitar os rostos
para evitar a fala.
E quando o céu abre e o sol faz cantar árvores
deixo que queime apenas minha nuca
pois me basta a lama nas botas.
"O ócio, Luiz, te é molesto; pelo ócio
exultas e demasiadamente gesticulas,
o ócio arruinou, antes, tantos reis como
cidades opulentas."
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
Passantes
A caminhada era lenta.
Vinham presos em conversa,
serenidade e copos na mão.
A noite era mais fresca,
as gotas de chuva fina acariciavam
os rostos jovens.
As ruas lhe assistiam,
as casas os ouviam
e a lua esperava, refletida no vinho,
para no próximo gole beijar seus lábios.
Vinham presos em conversa,
serenidade e copos na mão.
A noite era mais fresca,
as gotas de chuva fina acariciavam
os rostos jovens.
As ruas lhe assistiam,
as casas os ouviam
e a lua esperava, refletida no vinho,
para no próximo gole beijar seus lábios.
sábado, 25 de setembro de 2010
O Discreto.
Arranca da terra o coração
como separa o mar vermelho
com um simples gesto de mão.
Do pó ao ferro
do ferro ao cobre
do cobre ao ouro.
E de lábia convicta
de prévio decoro.
No silêncio de seus gestos
a agudez precisa
que inveja aos corretos.
como separa o mar vermelho
com um simples gesto de mão.
Do pó ao ferro
do ferro ao cobre
do cobre ao ouro.
E de lábia convicta
de prévio decoro.
No silêncio de seus gestos
a agudez precisa
que inveja aos corretos.
quinta-feira, 16 de setembro de 2010
A Maquina de Prover Sentimento
Na sua ausência o dia,
nublado, ainda tem o cheiro
que certa vez confundi
com um aroma a mais
de seu perfume.
Os braços, sem abraços,
sujeitam-se à agressão
de uma brisa fria
que surge de esgueira
dentre as árvores.
E o dia, escuro,
o verso,
e a nostalgía ambiente
são apenas sombras de quando
marcamos essa terra, unidos,
embebidos de vinho e paixão.
nublado, ainda tem o cheiro
que certa vez confundi
com um aroma a mais
de seu perfume.
Os braços, sem abraços,
sujeitam-se à agressão
de uma brisa fria
que surge de esgueira
dentre as árvores.
E o dia, escuro,
o verso,
e a nostalgía ambiente
são apenas sombras de quando
marcamos essa terra, unidos,
embebidos de vinho e paixão.
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
Desafinado.
Anda de esgueira à sombra da hostilidade.
O fio que agrada é o mesmo
que abre a ferida.
Sendo grão ou monte,
a palavra direcionada,
o naufrágio do encouraçado,
o beijo mal dado.
Tudo que já fora subtraido
faz peso na medida
da verdade escondida.
O fio que agrada é o mesmo
que abre a ferida.
Sendo grão ou monte,
a palavra direcionada,
o naufrágio do encouraçado,
o beijo mal dado.
Tudo que já fora subtraido
faz peso na medida
da verdade escondida.
terça-feira, 24 de agosto de 2010
Desconstrução.
Braços, pernas,
vísceras e lira.
Sobre o leito o tórax expõe
o coração seco de quem mira o passado.
O mito desmembrado pelas mãos pequenas da paixão.
vísceras e lira.
Sobre o leito o tórax expõe
o coração seco de quem mira o passado.
O mito desmembrado pelas mãos pequenas da paixão.
quinta-feira, 19 de agosto de 2010
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Epode I
Olhos fixos que concordam em sussurros
outros que seguem, atentos, tal atenção.
Um cão-gato-rato anônimo.
outros que seguem, atentos, tal atenção.
Um cão-gato-rato anônimo.
terça-feira, 10 de agosto de 2010
Κάθαρσις (Catarse)
Quando Horácio alcançou
o cume de tal colina
seus ouvidos eram
sonatas em fá e
a chuva que precipitava
lavou-lhe o suor do rosto
e fez de seu corpo
fio de ouro.
o cume de tal colina
seus ouvidos eram
sonatas em fá e
a chuva que precipitava
lavou-lhe o suor do rosto
e fez de seu corpo
fio de ouro.
terça-feira, 27 de julho de 2010
Herança
Cresci em terra rasgada ao meio, o que impossibilita a formação de um homem inteiro. A divisão da terra constrói uma divisão de alma, um lado índio e outro bandeirante (de colar de uma orelha só, a mesma que lhe falta no lado esquerdo da cabeça). Quando o Sol corre de nuvem em nuvem, no meio da tarde, sou espectador dos duelos de pipas que se enfrentam em colisseus infantis, sou gatilho por trocados mal-dados num suspiro de vício saciado. Entre trens e carroças. No vestido florido calçando chinelos que marca abismos no cimento seco do próximo morador. Pecado que forma prepotência. Certeza de vislumbre duvidoso.
Herança do fio de uma foice.
Herança do fio de uma foice.
sábado, 19 de junho de 2010
Dunas
Talvez houvesse maneira de chegar à conclusão esperada não tivessem sido ditas todas as palavras possíveis sem uma total expressão.
O corpo faz dunas nos lençóis. Dunas de um oásis noturno onde há calor e tranqüilidade.
Mas ainda não há palavras.
Já doei todos os olhos e toques. Deixei os lábios sobre sua superfície calma. Espalhei meus órgãos em oferenda sob seus pés.
Mas nunca houve palavras suficientes.
Sinto a não concreticidade da fé religiosa. Sinto a desorientação do amor camoniano.
É toda a dor aconchegante, é toda a entrega, as camisas perfumadas, os meus olhos no vento de seu cabelo. São as dunas onde me deito.
E durmo, por dias. Durmo sentindo o palpitar do meu coração que está enterrado lá, no fundo dos lençóis.
Faz um ano que não encontro palavras para lapidar uma placa sobre meu templo. Me sinto gago ao tentar repetir a melodia mas deixo que seus dedos continuem a tocar as cordas.
Então me deito e amo em silêncio cada duna do seu corpo durante dias, e anos. E não pretendo me levantar. Sorrio em silêncio e amo devoto.
O corpo faz dunas nos lençóis. Dunas de um oásis noturno onde há calor e tranqüilidade.
Mas ainda não há palavras.
Já doei todos os olhos e toques. Deixei os lábios sobre sua superfície calma. Espalhei meus órgãos em oferenda sob seus pés.
Mas nunca houve palavras suficientes.
Sinto a não concreticidade da fé religiosa. Sinto a desorientação do amor camoniano.
É toda a dor aconchegante, é toda a entrega, as camisas perfumadas, os meus olhos no vento de seu cabelo. São as dunas onde me deito.
E durmo, por dias. Durmo sentindo o palpitar do meu coração que está enterrado lá, no fundo dos lençóis.
Faz um ano que não encontro palavras para lapidar uma placa sobre meu templo. Me sinto gago ao tentar repetir a melodia mas deixo que seus dedos continuem a tocar as cordas.
Então me deito e amo em silêncio cada duna do seu corpo durante dias, e anos. E não pretendo me levantar. Sorrio em silêncio e amo devoto.
terça-feira, 1 de junho de 2010
A pedra do pastor.
Tremula bandeira
no córtex da terra
onde antes
mais leve, sem o
peso da patente
já era
alívio em campo sem seio.
Pois que o fim da fome
sem o sangue da nação
não dá bril
ao homem;
Sine qua non!
no córtex da terra
onde antes
mais leve, sem o
peso da patente
já era
alívio em campo sem seio.
Pois que o fim da fome
sem o sangue da nação
não dá bril
ao homem;
Sine qua non!
terça-feira, 25 de maio de 2010
Porto vago.
Como se fosse eu o culpado
pelo rolar das pedras soltas.
Ao anoitecer, quando a fadiga é
um pouco maior e
mais aconchegante que o tédio,
me pus a vislumbrar o alto
e esperar pela âncora que
se cravaria aos pés do mundo
e estenderia a noite
ao fôlego dos pássaros.
Mas por demasiada pressa,
corrente insuficiente ou
solo frouxo, as estrelas ainda
caminharam.
Como se fosse eu o culpado
pelo rolar das pedras frouxas.
pelo rolar das pedras soltas.
Ao anoitecer, quando a fadiga é
um pouco maior e
mais aconchegante que o tédio,
me pus a vislumbrar o alto
e esperar pela âncora que
se cravaria aos pés do mundo
e estenderia a noite
ao fôlego dos pássaros.
Mas por demasiada pressa,
corrente insuficiente ou
solo frouxo, as estrelas ainda
caminharam.
Como se fosse eu o culpado
pelo rolar das pedras frouxas.
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Louvor de feriado.
" - Está pensando para que? Não pense, só sinta! Vamos sentir um pouco do nosso egoísmo! É lindo fazer o feio, é vanguarda ser torto, ser clown bêbado de palco. Façamos uma roda e contemos, entre aplausos, como enfeitamos nossas ações mais impulsivas. Agora pare, não pense mais! Afinal, se a leitura é burra porque haveria de ser penosa a escrita?"
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Fratelli
Di che reggimento siete
fratelli?
Parola tremante
nella notte
Foglia appena nata
Nell'aria spasimante
involontaria rivolta
dell'uomo presente alla sua
fragilità
Fratelli
(Giuseppe Ungaretti - Mariano il 15 luglio 1916)
fratelli?
Parola tremante
nella notte
Foglia appena nata
Nell'aria spasimante
involontaria rivolta
dell'uomo presente alla sua
fragilità
Fratelli
(Giuseppe Ungaretti - Mariano il 15 luglio 1916)
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