quinta-feira, 29 de outubro de 2009
Precipitação
Uma frota de navios roçam o cais e trazem pacotes. Pacotes e homens, que por sua vez trazem saudades, salários e sífilis do Leste. Da terra do Sol nascente, do trigo, dos olhos e fios escuros. Enquanto aqui termina uma longa jornada de trabalho, do outro lado da cidade homens afundam-se em lama e pedras com suas britadeiras e lanternas construindo o ninho da grande minhoca metálica cujo coração é um terceiro trilho. Mulheres fazem jornada dupla entre a solidão e a maternidade. Crianças se perdem em multidões e observam cadarços desamarrados. Técnica. Tudo se baseia em técnica. E os edifícios, soberanos em cálculos e metais, observam silenciosos, com seus balançares de elefante, toda essa mirmecologia mamífera. Há correntes marítimas, correntes culturais, correntes migratórias e correntes, simplesmente. Alguns pássaros seguem para o norte, alguns condenados para a cadeia. Garotos se alistam, pegam fuzis e juram ao que amanhã hão de praguejar, garotas entram na universidade e bebem até acordar ao lado de um sujeito de sandálias. O feto se forma besuntado em álcool e já entende o mundo mesmo antes de receber suas unhas. Chaminés, canos, gargantas, espingardas. Nada fica eternamente recluso, o mundo age expelindo. Magma jorra pela grande acne de pedra. Doninhas saindo de suas tocas. Espermatozoides ejaculados. Almas sopradas. Dentro de seis meses alguns homens deixarão novamente suas casas sendo lançados ao mar. Lançados à tormentas, escorbuto, e ao abraço solitário de uma prostituta tailandesa. Dançarão a noite toda para que quando seus olhos se fecharem, sobre o peito moreno de suas amantes, o Sol se abra, esquente-lhes as almas e cegue suas pendências.
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2 comentários:
Que viagem. Uma coisa levando a ou tra, e tudo vai se encaixando num cenário maior.
Muito bom!
=*
"Alguns pássaros seguem para o norte, alguns condenados para a cadeia"
Gostei demais dessa parte! Absurdo de texto!
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