Aos poucos o rosto do rapaz ia se abrindo como planejado. Olavo sorria, arquitetando um sorriso mesclado que não lhe desse ares de bobo-sonhador. Tentava alcançar um tom de gentileza bordado de convicção, esse sim deveria funcionar.
Há 2 meses procurava emprego. A última empresa em que trabalhou deu-lhe experiencia e alguns meses de salário significativo, mas em tão pouco tempo a crise se instalou por lá e tratou de recortar boa parte do contingente efetivo. Na verdade não foram muitos, só ele, e tudo estaria bem se essa tal “crise” não fosse o cunhado desempregado do diretor.
Porém, amaldiçoar famílias unidas não lhe encheria o bolso , mas sim a gravata e o sorriso quebra-gelo que usava como armas para lançar-se a uma nova tentativa desesperadamente disfarçada.
- Então, Olavo, certo? Por que esse sorriso no rosto?
O senhor a sua frente mirava-o com seus pequenos olhos azuis, de maneira insignificante, enquanto preenchia alguns papéis aleatórios que se espalhavam pela mesa de mogno encerada. Era um tipo de altivez grotesca no alto de seus um metro e quase noventa de gordura e rugas. Os poucos fios brancos de cabelo salpicavam o topo de sua cabeçorra vermelha que já dava sinais de ceder aos efeitos da gravidade. O grande nariz de bexiga pendia frente ao rosto como uma bolha e o lábio inferior, caído, tinha aspecto de gelatina.
- Sorrisos não vendem caminhões. Conhecimento do produto os vendem. Diga-me, já trabalhou com isso?
Lábios trepidam. A palavra do grande Lorde foi lançada. Lorde da concessionária, Barão de RH, Duque da seleção de candidatos.
- Obrigado.
E foi assim. O velho obrigado seco e sem expectativas, uma daqueles que nos fazem implorar um pouco de mentira e esperança.
O rapaz levantou e saiu do escritório, atravessando a frota de monstros metálicos da Mercedes Benz para só, quando já longe do campo de visão do grande “outdoor” da empresa (o brasão real), desfazer sua máscara de pretensões e questionar os motivos dessa derrota. Caminhava com pressa rumo ao metrô. Talvez não tivesse construído a imagem necessária, talvez não fora tão simpático quanto deveria... Talvez...
E ao contornar a catraca e virar-se para a escada rolante, um sujeito qualquer, um apressado de cabelos bagunçados e corpo franzino, tromba de ombro contra Olavo e, no mesmo momento, roda sobre os calcanhares com um aceno e sorriso simpático estampado no rosto. - Desculpe, eu.. - mas é calado pelo punho de Olavo.
“Desculpe o caralho, e tira esse sorriso da cara!”
4 comentários:
bom pra caralho...
Muito bom e muito Luizístico! Hahahah.
Muito bom mesmo!
O tipo do texto que se lê sem nem hesitar.
E adorei o final!
=]
I like it. Em especial a descrição do gordo lábios de gelatina.
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